sábado, 26 de março de 2011

Computers & Blues

Saudações melómanas a todos. Hoje, o MDC decidiu “arrumar a casa”. O número de discos a avaliar começou a acumular-se (muito por culpa de falta de inspiração para escrever), e por isso, vamos começar esta “arrumação” com um disco que saiu no dia 7 de Fevereiro: “Computer & Blues”, de The Streets, o nome do projecto de UK Garage e Hip-Hop de Mike Skinner. Este quinto disco foi anunciado por Skinner como o último do projecto, pelo que eu, fã das suas obras, fiquei na expectativa. Depois de já ter ouvido várias vezes o CD, creio estar pronto para falar dele aqui. Vamos a isso?

Bem, para começar, a minha expectativa não saiu defraudada. O disco está uma obra muito boa, do início ao fim. Tem as suas falhas, é certo, mas consegue deixar uma marca difícil de apagar. Talvez seja por ser o último disco de The Streets, mas a verdade é que sinto uma energia neste álbum que não encontrei no anterior “Everything Is Borrowed” (2008), que não era mau, mas que não marcou uma grande impressão. Este “Computer & Blues”, por seu lado, consegue continuar fresco a cada vez que o ouço.

O disco abre (e abre muito bem, devo dizê-lo) com “Outside Inside”, que marca logo a “passada” do disco. Skinner não quer só acabar; quer acabar em grande. Para isso, cria um álbum que, apesar de não ter uma temática concreta, única e transversal (para isso, Skinner criou “A Grand Don’t Come For Free”, o álbum conceptual de 2004), está “emaranhado” numa teia melancólica, que faz com que o disco soe muito coeso e unido. Essa melancolia é particularmente evidente em músicas como “Puzzled By People” , “Soldiers” ou “OMG”, que aliam letras mais tristonhas com instrumentais belos, que me levaram à introspecção. No entanto, a tristeza é ainda mais evidente em “We Can Never Be Friends”, a balada de amor derrotista, de som mais acústico. Contudo, não fiquem com a impressão que o disco é só tristeza: como disse, o álbum não tem um tema explícito, pelo que há músicas que escapam à regra: “Roof of Your Car” e “Without Thinking” são músicas que fogem à “aura” geral do LP e que se aguentam de forma esplêndida. No entanto, como eu disse, o álbum está “emaranhado”, o que quer dizer que, apesar de por vezes nos afastarmos, mais tarde ou mais cedo (e aqui é mais cedo) vamos voltar a ouvir a tal tristeza. Porém, ao aproximarmo-nos do final do CD, chegamos àquela que é, para mim, a melhor música do álbum, e que foge por completo a este “esquema”: “Trust Me”, uma faixa muito “upbeat”, com um ritmo muito alegre, e que prepara o terreno de forma brilhante para “Lock the Locks”, que fecha com “chave de ouro” este “Computer & Blues”.

Não se pense, porém, que este álbum está livre de falhas. Uma das mais sérias críticas que tenho a apontar é um problema que já vem de trás: a incapacidade que The Streets tem de fazer discos que não caiam no erro de ter uma ou outra música de enchimento, desnecessárias e aborrecidas. Para mim, neste “Computer & Blues”, músicas como “Blip On a Screen” ou “Those That Don’t Know” podiam ser perfeitamente dispensadas, pois só vêm cortar o ritmo a um disco pejado de canções gloriosas. Apesar de o disco ser muito bom, há que assinalar esta “falha”.

Resumindo, este “Computers & Blues” é uma óptima maneira de fechar o projecto The Streets, pois encerra de forma magnânima uma saga de cinco álbuns, iniciada em 2002. Neste disco, Skinner mostra uma vez mais aquilo que já devia ser uma certeza: é um produtor extremamente capaz, que consegue criar texturas musicais verdadeiramente belas. Só me resta desejar que Mike decida um dia voltar a trás com a sua palavra. Nós, fãs, agradeceríamos. E muito.

Nota Final: 8,9/10

João Morais

domingo, 20 de março de 2011

Resultados da Votação

Boa noite. Peço desculpa pelas horas tardias a que estou a postar isto, mas a verdade é que só agora me foi possível começar a escrever para o blog (vida atarefada, esta). Contudo, o que tenho para dizer é isto: após dois meses e meio de votação, o inquérito acerca do vosso álbum favorito do Top 10 de 2010 do MDC chegou ao fim, e o resultado é, surpresa das surpresas, coincidente com o do Música Dot Com: “The Suburbs”, dos Arcade Fire, que foi votado por 31% dos votantes (5 votos, numa sondagem que reuniu um universo eleitoral de 16 pessoas) é o vencedor, seguido de perto de Kanye West, e o seu “My Beautiful Dark Twisted Fantasy”, com 25% (4 votos). A fechar o Top 3, temos o “nosso” B Fachada, com o seu “B Fachada É Pra Meninos”, que angariou 18% (3 votos). Empatados no 4º lugar estão 4 bandas (curioso, huh?): Broken Social Scene, com “Forgiveness Rock Record”, Black Keys, com “Brothers”, MGMT, com “Congratulations” e Deerhunter, com “Halcyon Digest”. Estes 4 grupos tiveram cada um 6% dos votos (um voto cada, portanto). No quinto lugar, sem nenhum voto, estão as três obras restantes: “This Is Happening”, “Before Today” e "The Drums", dos LCD Soundsystem, dos Ariel Pink’s Haunted Graffiti e dos The Drums, respectivamente.

Em jeito de reflexão, devo revelar a minha tristeza pelo facto da votação ter tido uma fraca participação. No entanto, num país onde a abstenção eleitoral ultrapassa os 50%, confesso que não fico surpreendido. Espero que na próxima poll (a revelar nos próximos dias), haja mais gente a votar, pois isso é um sinal de aproximação das pessoas ao blog, algo que eu prezo muito. Até ao próximo post, oiçam boa música!

Resultados:


1. Arcade Fire - "The Suburbs" - 5 votos (31%)

2. Kanye West - "My Beautiful Dark Twisted Fantasy" - 4 votos (25%)

3. B Fachada - “B Fachada É Pra Meninos” - 3 votos (18%)

4. Broken Social Scene - “Forgiveness Rock Record” - 1 voto (6%)

5. Black Keys - “Brothers” - 1 voto (6%)

6. MGMT - "Congratulations" - 1 voto (6%)

7. Deerhunter - "Halcyon Digest" - 1 voto (6%)

8. LCD Soundsystem - "This Is Happening" - 0 votos (0%)

9. Ariel Pink's Haunted Graffiti - "Before Today" - 0 votos (0%)

10. The Drums - "The Drums" - 0 votos (0%)


João Morais

quinta-feira, 17 de março de 2011

Gogol Bordello @ Campo Pequeno

Olá a todos. Hoje o MDC traz-vos uma pequena análise ao concerto dos Gogol Bordello, que teve lugar no Campo Pequeno, no passado dia 7 de Março. Este foi um concerto que fez parte da promoção do mais recente disco do grupo, “Trans-Continental Hustle”, álbum lançado em Abril do ano passado. Falemos do espectáculo, pois então.

A abertura do “show” foi feita pelo grupo de sul-americanos residentes em Barcelona, Che Sudaka, que infelizmente não fui capaz de ver (a minha sina no Campo Pequeno no que às bandas de abertura diz respeito continua a ser a mesma...), no entanto, dava para se sentir que este grupo tinha posto a plateia (casa quase cheia) em “ponto de rebuçado” para a festa que se seguiria. Entrando em palco às 22h20m, a trupe de Eugene Hütz é recebida em apoteose pelo público, sedento de festa.

Foi com “Tribal Connection” (do álbum de 2007, “Super Taranta!”) que foi inaugurada a setlist, que procurava combinar canções dos discos mais antigos com o mais recente “Trans-Continental Hustle” (das 21 canções da noite, apenas 8 eram do mais recente disco, o que mostra um certo equilíbrio). Quanto à qualidade de som, devo constatar que estava muito melhor do que no concerto dos Interpol (se bem que num concerto destes, esse tipo de questões é o que menos interessa).

“Not a Crime” e “Wonderlust King” foram as canções que iniciaram uma loucura que durou até ao resto da noite. Se nas primeiras duas músicas os saltos e “moshs” foram residuais, a partir daí começaram a ser constante (excepção feita a canções como “My Companjera”, que é de facto uma balada com um ritmo mais lento, e que me permitiu recuperar o fôlego). Após uma série de canções do disco mais recente, (que de facto foi feito para “brilhar” ao vivo, mais do que para apelar aos críticos) veio “American Wedding”, “Pala Tute” (mais uma música do disco de 2010) e “Start Wearing Purple”, um dos maiores êxitos da banda, e que terminou a primeira parte do concerto.

No entanto, Lisboa teve direito a um encore de luxo, com 4 canções, entre as quais a fabulosa “Think Locally, Fuck Globally”, que levou toda a gente ao rubro, mesmo apesar do cansaço que já se começava a sentir. Após uma saída de palco que parecia terminar o concerto, os Gogol Bordello voltaram, com Eugene Hütz a tocar, enrolado na bandeira portuguesa, “Alcohol”, um verdadeiro hino àquele que foi o combustível deste concerto (durante o show o vocalista foi dando vários goles duma garrafa de vinho, que eu assumi que fosse do Porto). A noite chegou ao fim com uma cover dos Mano Negra, “Mala Vida”, com os membros dos Che Sudaka a juntarem-se aos Gogol em palco, e que fechou a noite da forma como tinha começado: em festa!

Setlist do concerto:

  1. Tribal Connection
  2. Ultimate
  3. Not a Crime
  4. Wonderlust King
  5. My Companjera
  6. Last One Goes The Hope
  7. Trans-Continental Hustle
  8. Immigraniada (We Comin' Rougher)
  9. Break The Spell
  10. Raise The Knowledge
  11. When Universes Collide
  12. American Wedding
  13. Pala Tute
  14. Start Wearing Purple
  15. Break The Spell (Reprise)

Encore 1:

  1. Think Locally, Fuck Globally
  2. Sun Is On My Side
  3. Mishto!
  4. Sacred Darling

Encore 2:

  1. Alcohol
  2. Mala Vida

(cover dos Mano Negra, com os Che Sudaka)

PS: A votação para o vosso álbum favorito de 2010 acaba amanhã, por isso, se ainda não votaram, apressem-se e votem!

João Morais

quarta-feira, 9 de março de 2011

The King of Limbs

Boa noite a todos. Após uma “pausazinha” de Carnaval,o MDC está de volta, com a review do mais recente disco duma banda muito especial: os Radiohead, e o seu “The King of Limbs”. Se bem se lembram, um álbum novo dos Radiohead foi visto pelo Música Dot Com como uma das grandes expectativas para 2011. Será que os ingleses conseguiram manter-se à altura do desafio dum novo disco? Vejamos.

Falemos primeiro da forma como este disco nos chegou às mãos. “The King of Limbs” trocou, sem dúvida, as voltas a toda a gente, ao nível do anúncio, promoção (ou falta dela, neste caso) e distribuição. Apesar de agora já não ser virtualmente grátis, como foi “In Rainbows”, “TKoL” ainda segue uma linha bastante irreverente no que toca à comercialização da música. Com o anúncio do disco a ser feito na Segunda-Feira, dia 14 de Fevereiro, marcado para 19, Sábado seguinte, e adiantado para a Sexta-Feira, dia 18, os Radiohead conseguiram surpreender toda a gente. Apesar de eu ter dito que esperava um novo álbum deles ainda este ano, devo confessar que não estava à espera que fosse lançado desta maneira, e tão cedo. Por isso, posso dizer que foi um choque para mim. No entanto, mais do que o choque, veio a surpresa. As modalidades de compra, divididas entre compra digital simples (MP3 ou WAV) e uma edição “jornal” com disco em vinil é algo que me intriga. O que será, em concreto, a edição em “jornal”? Bem, isso só o tempo dirá. Contudo, uma coisa é certa: os Radiohead chegaram a um ponto de segurança notável, onde conseguem fazer a sua música, e sem alarido, “libertá-la” para os fãs a ouvirem. E é aqui, no “ouvir”, que está o mais interessante do disco: a música em concreto.

À primeira “vista”, consegue-se fazer logo uma observação fácil: o álbum é curto. 8 músicas são pouco para uma banda que já nos habituou a discos com um comprimento considerável. No entanto, com os Radiohead, já se sabe: a qualidade está acima da quantidade, e este disco é a prova viva disso. Apesar de todos os rumores que circulam por aí duma “segunda parte” de “The King of Limbs”, a verdade é que se estas 8 faixas são tudo o que temos, então não estamos mal servidos. E nestas 8 faixas, encontramos uns Radiohead que contrariam o que se esperava deles. Enquanto que “In Rainbows” foi um regresso a uma música mais “orgânica” e “terra-a-terra”, com instrumentos mais “normais” para uma banda Rock, “The King of Limbs” mostra novamente um som mais etéreo e sonhador, reminiscente de “Kid A” e “Amnesiac”. Pode-se dizer, por isso, que “TKoL” mostra uma ruptura com a sonoridade de “In Rainbows”, se bem que se podem notar alguns pontos de contacto (especialmente na secção rítmica).

Analisando com mais cuidado, devo dizer que o álbum, no geral, agradou-me, apesar de “The King of Limbs” não ser de audição fácil. Como já é costume com os Radiohead, a primeira vez que ouvi o disco foi um pouco confusa. Apesar de não ter desgostado, não morri de amores pelo álbum. No entanto, despertou em mim uma curiosidade que me fez ouvir de novo, e encontrar texturas sonoras que me fizeram adorar o disco (a forma como a bateria e o baixo jogam entre si, ou as influências Jazz estão dentro destas “texturas” maravilhosas que escapam a um ouvido mais distraído). Por volta da terceira audição, rendi-me às evidências: os Radiohead são mestres naquilo que fazem. No entanto, devo confessar uma desilusão: falta um pouco mais de Jonny Greenwood neste disco. A guitarra dele, apesar de presente, não se faz ouvir com tanta intensidade em “TKoL” como se fez escutar em “In Rainbows”, e isso é uma pena, porque ele é um dos melhores guitarristas da actualidade.Contudo, o álbum tem muitas coisas boas que conseguem apagar esta lacuna.

Nas faixas iniciais (“Bloom”, “Morning Mr Magpie”, “Little by Little” e “Feral”) conseguimos ouvir “drumbeats” loopados, à boa moda de “15 Step” (o tal ponto de contacto), mas que aqui dão-nos uma sensação de ansiedade, que é, aliás, um dos temas que mais consegui captar deste álbum. Após este início mais mexido, passamos a “Lotus Flower”, o single de estreia do disco, e que é, de longe, a canção mais “acessível” do álbum. É “catchy” o suficiente para nos pôr a trautear a canção pouco depois de a termos ouvido. Uma faixa simples e eficaz. Depois passamos às músicas que eu menos gostei no disco: “Codex” e “Give Up the Ghost”. Não quero com isto dizer que são más, porque não são, mas parecem um pouco deslocadas, numa altura em que o ritmo do disco estava em claro “crescendo”. Isto alia-se ao que eu tinha dito sobre a tal “ansiedade”: ficamos com a expectativa que o disco desemboque numa “bomba”, mas esta nunca chega. E depois, assistimos a um corte no ritmo que mata esta intensidade que o disco poderia ter. A meu ver, há aqui um problema de estrutura, que poderia ter sido mitigado com uma outra ordem nas canções, que permitisse ao disco “crescer” livremente sem entraves. Uma falha do disco, a meu ver, e que pesa no meu veredicto final. Apesar de tudo, o disco acaba em grande, com “Separator” a dar-nos a sensação que algo fica por dizer, com umas enormes reticências a pairarem no horizonte. É nisto que os Radiohead são bons: a despertarem em nós coisas que não esperávamos vindas dum disco e música. Se é certo que “The King of Limbs” tem os seus pontos menos bons, este não é um deles, muito pelo contrário.

Em suma, os Radiohead assinam em “The King of Limbs” um álbum que é a “cara deles”. Com uma clara progressão para territórios que cada vez mais quebram as barreiras do género, Thom Yorke e companhia afirmam-se como uma das bandas mais relevantes do nosso tempo. Apesar das falhas, “The King of Limbs” não deixa de ser um bom disco, que recomendo, especialmente aos fãs da banda, que vão encontrar “familiaridades sonoras desconhecidas” (uma contradição tipicamente “Radiohead-esca”) neste álbum. Espero é que não demorem muito a lançar mais álbuns, porque um disco tão curto não chega para matar saudades.

Nota Final: 8,4/10

João Morais