quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Discos com Graça: Olhos de Mongol

Descomprometidos com o mundo, erguem-se em complexidades instrumentais capazes de nos preencher, centímetro a centímetro, milímetro a milímetro, a alma.

Olhos de Mongol trata-se de um disco extremamente coeso e penetrante, onde a sonoridade ganha asas e não desce dos céus e onde o lirismo, sempre simples e eficaz, funde-se com a complexidade instrumental e penetra-se pela nossa cabeça sem querer retornar à esfera real.

Com músicas absolutamente divinais, o quarteto edificou, indubitavelmente, um álbum [extremamente] rico em sonoridade, poesia e talento.

Olhos de Mongol obriga-nos a voltar a Outubro de 2006 [um ano depois de a banda ter lançado o seu primeiro EP, intitulado Linda Martini], e é constituído por 9 faixas com um total de, aproximadamente, 42 minutos. Tendo como editora a Naked, o álbum conta com:
1.       Sinto a cabeça a cair – Esta é a música mais simples de todo o LP, funcionando como uma introdução ao mesmo. Apesar de toda a sua simplicidade, é a partir do momento que escutamos esta faixa que começamos a ganhar consciência de que este Olhos de Mongol deve ser escutado atentamente, pois trata-se de um escape à esfera real. Começo razoável e intrigante.
2.       Cronófago – A partir da segunda faixa do registo são-nos introduzidas as poderosas guitarras com que o quarteto cessa a sua fome. Edifica-se, ao longo do tema, uma muralha de distorção soberba que, aliada a uma atmosfera potente, prende o ouvinte no verso «São carris que me prendem aqui/ à velha casa onde tudo é igual». Obrigando o ouvinte a deambular-se pelos vocativos empregues, salta-nos o desejo de querer esmiuçar o mesmo. Nesse «passeio» em torno do verso, ergue-se-nos a ideia dos conceitos de rotina, homogenia e igualdade [conceitos, esses, que nos persistirão até ao fim do LP]. Potente.
3.       Dá-me a tua melhor faca – Esta música é, simplesmente, demolidora. Nascendo no seio do poderio instrumental [com ênfase para as guitarras], um personagem aparece-nos abafado pela dor e, por isso, mudo. À medida que o quarteto se alimenta do seu som, a música, inicialmente ultra-violenta, vai desaguando numa sonoridade suave e agradável [fazendo, em muito, lembrar certas paragens do Post-Rock] e o dito personagem vai ganhando alento e coragem para nos relatar a sua dor. A dor que o inquietava, abrupta, teimava em não lhe dar tréguas e o sujeito, amedrontado com o cenário, julgava-se num labirinto rodopiante onde solucionar a sua saída era penetrar desenfreadamente pela sua maior ferida. Angustiado pela cena, mirava uma luz no fundo do túnel. Envolto de um ambiente sonoro agradável e calmo, o personagem [que fala mais do que canta] serve-se de um lirismo simples e repete continuamente o verso «Dá-me a tua melhor faca/ para cortarmos isto em dois/ e amanhã esquecer», num repetir apetrechado de uma réstia de esperança. Basilarmente, estes versos servem de metáfora à dor vivenciada pelo personagem naquele momento. Com a ânsia de aliviar a dor, destila uma solução. Seria mais fácil partir a sua dor em duas fatias, uma dor contada é uma dor acalmada. Naquela efemeridade de tempo em que repete desalmadamente o verso acima referido, o personagem procura alguém para falar, um colete salva-vidas que lhe impeça que a bala lhe penetre o peito. Após cinco pedidos de ajuda sem qualquer tipo de resposta, o ambiente calmo e agradável desta Dá-me a tua melhor faca sofre uma volta de 180 graus e tempera-se, nela, uma agressividade letal. O personagem sucumbe à dor e silencia-se até ao término da música. A dor vence-o e a bala penetrou-se-lhe. É criada uma atmosfera absolutamente divinal, fazendo com que as nossas pernas tremam, com que a nossa cabeça palpite, com que o nosso coração queira explodir. Uma música esquizofrénica, numa mistura de emoções tremenda. Fabulosa.
4.       Partir para ficar – O lirismo desta música deriva da lendária FMI, do célebre José Mário Branco. Depois do quarteto ter pegado numa parte da composição lírica acima referida, foi-lhe conferida uma paisagem reinada pela incerteza e por um ambiente sombrio. Trata-se de um poderio instrumental que é banhado por quantidades extremas de emoção. Obrigando o ouvinte a imaginar-se numa paisagem inóspita, rude, escura, soturna, incerta e atroz, acaba-se por construir um momento singular e saboroso. Excelente momento musical.
5.       Estuque – Provavelmente escrita com influências de Cláudia Guerreiro [licenciada em escultura], Estuque acaba-se por revelar um dos grandes tesouros do registo. Arquitectada com uma letra sublime, a faixa número cinco deste LP aparece-nos estruturada de uma forma visivelmente pensada. Moldada com uma sonoridade agradável, é aqui que André Henriques mostra-nos, inicialmente, a sua capacidade vocal, fazendo soar a sua voz melhor do que nunca. Envolvendo os fãs num ambiente rústico, esconde-se o melhor para o fim e, repentinamente, somos invadidos por um solo extraterrestre. Invasor.
6.       O amor é não haver polícia – Esta faixa retrata, muito possivelmente, a música mais intensa, apaixonante e dolorosa que já ouvi. Inicialmente falando mais do que cantando, gera-se um ambiente intrigante e escuro, cheio de incógnitas, banhado por uma sonoridade rica em conteúdo. Demonstrando toda a sua genialidade instrumental, à medida que a canção vai fluindo, vai ganhando ritmo e as palavras vão sendo debitadas com maior rapidez. Envolta por um ritmo acelerado, a música vai ganhando novos contornos e vai-se transformando numa faixa mais pesada. Agarrando o ouvinte no verso «Eu queria tanto parar aqui», solta-se um berro apaixonante e doloroso, exponenciando a vertente esquizofrénica do álbum para outro patamar. Liricamente trata-se de uma das faixas mais elaboradas do álbum com momentos líricos como, por exemplo, «O mundo é grande e em todo o lado se vive. Diz-lhe para parar aqui, vivemos em caixas de fósforos. Não sopres» a sobressaírem. Estupendo.
7.       Quarto 210 – A meu ver, trata-se da faixa menos conseguida de todo o registo. Apesar da vertente lírica ser simples e deliciosa, não se acha a «explosão» instrumental que se deambula pela nossa mente quando ouvimos Linda Martini. Repleta de soturnidade, este Quarto 210 aparece-nos, instrumentalmente, simples e sem qualquer manobra de distorção, acabando por deixar água na boca aos fãs mais vibrantes da banda. Razoável.
8.       Amor Combate – A faixa número 8 deste LP assinala a música mais conhecida de toda a discografia dos Linda Martini. Recheada por uma componente lírica sublime, este «Amor Combate» aparece-nos condimentada por uma sonoridade exímia. Uma banda que, geralmente, não prima pelos dotes vocais do seu vocalista [André Henriques], acaba por elaborar uma faixa onde André demonstra ser provido de uma agradável capacidade vocal. Também nesta faixa a bateria, com Hélio Morais ao leme, aparece-nos louca [e isto é um elogio]! De facto, Hélio Morais consegue demonstrar, não só nesta faixa mas também ao longo de todo o álbum, que é o melhor baterista português da actualidade. Com uma criatividade extraordinária e com uma energia tremenda, pega nas baquetas e toca como se o amanhã estivesse por um fio. Um arrojo musical extremamente bem conseguido. Formidável.
9.       A Severa (ver de perto)A Severa é o momento alto do registo, o seu clímax. Uma música progressiva, suave, lenta, rápida, agressiva, calma, esquizofrénica. Unem-se todos os vocativos que se empregam na caracterização de Olhos de Mongol, e obtém-se a descrição de A Severa (ver de perto). Abre-se uma guerra num reino de distorções e quatro versos de pura poesia banhado por um mar de talento e obtém-se uma faixa perfeita. Frenética.

Pautado por uma sonoridade única, por um lirismo repleto da alma vazia e por uma atmosfera incrivelmente intensa, Olhos de Mongol acaba por se revelar um dos registos mais intensos e ricos que já ouvi. As suas letras, intrigantes, criam uma fusão fria e escura com a sua instrumentalidade absolutamente esquizofrénica, conferindo vida extraterrestre à sua musicalidade.

Levando o ouvinte a devanear-se por cada canto da sua complexa forma oval e a acelerar o seu ritmo cardíaco a cada palavra soletrada, os Linda Martini, alheios a compromissos, soam-nos maravilhosos num rio de sentimento e intensidade. Num passeio exterior à esfera real, somos constantemente penetrados pela musicalidade arrepiante do quarteto faminto. Um som único e que prima pela sua originalidade.

Arrebatadores, Hélio Morais, Pedro Geraldes, André Henriques e Cláudia Guerreiro, continuam a dar provas de que existe vida para além desta esfera.

Emanuel Graça

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Mixtape da Semana // Week 9

Para a sua nona edição, a Mixtape da Semana traz-vos uma colecção de 10 músicas carregadas de política. Mensagens pacifistas, ambientalistas ou simplesmente de pura anarquia e rebelião, as faixas de hoje podem não se englobar todas na categoria de “música de intervenção”, mas são certamente gritos de revolta de bandas e artistas que não se deixavam conformar com o status quo da injustiça. Destaco também duas canções em especial, Os Índios da Meia-Praia (Zeca Afonso) e Search and Destroy (The Stooges), que estão certamente na minha lista de all-time favourites.

Esta Mixtape conta com as seguintes faixas:
·         Straight Outta ComptonN.W.A.
·         Sunday Bloody Sunday U2
·         Moon Over Marin Dead Kennedys
·         Anarchy in the U.K. Sex Pistols
·         Killing in the Name Rage Against the Machine
·         Search and DestroyThe Stooges
·         Ohio Crosby, Stills, Nash & Young
·         Street Fighting Man The Rolling Stones
·         The Times They Are a-Changing Bob Dylan
·         Os Índios da Meia-PraiaZeca Afonso


sábado, 25 de fevereiro de 2012

Música Nova: Tropical Tobacco

Misterioso e sediado em Lisboa, Tropical Tobacco é a minha mais recente “descoberta” da música independente nacional. Com uma música (descrita pelo próprio como) “fresquinha”, Tropical Tobacco traz-nos uma abordagem inovadora da Dream Pop, misturando elementos Chillwave e Afrobeat nas suas composições.

Por enquanto ainda só temos direito a uma promo, aboriginal, que conta com duas canções (Pineapple Express e Ambiguous) que me trouxeram à cabeça nomes como Youth Lagoon, Toro Y Moi e até um pouco de Animal Collective, todos bem mexidos com um gostinho “tropical” de um mojito bem aviado. Fico à espera de poder ter mais deste Tropical Tobacco, pois esta passa deixou-me de água na boca.

Para saberem mais sobre Tropical Tobacco e poderem ouvir/sacar a promo:

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Discos com Graça: Grace

Jeff Buckley foi uma gota de cristal num rio imerso de ruídos sentimentalistas.

Na primeira estrofe de Grace, na suave Mojo Pin, Jeff Buckley dá a entender-nos o que canta ao longo do álbum: a sua dor e a sua necessidade de descobrir a essência da vida e do amor. Levando o ouvinte a viajar para outro mundo, este disco aparece-nos sob uma atmosfera intensa e sentimental.

O cantor norte-americano, filho da lenda Folk Tim Buckley, brinda-nos com uma voz absolutamente devastadora e bela, capaz de se deambular por rumos completamente opostos como, por exemplo, a voz explosiva e agressiva patenteada em Eternal Life e o registo suave e encantador em Lilac Wine. Com uma versatilidade fora do normal, o génio de Jeff Buckley emerge, também ele, na guitarra. Com músicas como Grace e So Real, ganhamos consciência de que o seu génio se despedaçava em pequenas parcelas que o cimentavam como um artista completo.

Outro dom notável do californiano era a sua aptidão para a escrita. Banhando as suas composições líricas em sentimento e emoção, Buckley demonstrava expressar-se de uma maneira única e sublime. Maior exemplo deste seu dom será, seguramente, a memorável Lover, You Should've Come Over.

Grace, um álbum imerso de graciosidade:
O disco remonta a Agosto de 1994 e é constituído por 10 faixas, com um total de 51 minutos e 44 segundos. Tendo como editora a Columbia Records, Grace  conta com:
1.       Mojo Pin – A primeira estrofe dá-nos a ideia do que Jeff Buckley pretende fazer ao longo de todo o disco. O álbum começa de uma maneira formidável, dando-nos, de imediato, a ideia de que devemos encará-lo de uma maneira bastante séria. Nesta primeira faixa Buckley aparece-nos demolidor, com uma capacidade vocal tremenda e capaz de aguentar notas longas por uma infinidade de tempo. De facto, é mesmo impressionante a quantidade de tempo que Buckley consegue gritar sem qualquer tipo de desafinação. Começando por ser suave, a música vai-se compondo e tornando robusta até que atinge o clímax. Este clímax dá-se quando a dor do cantor decide começar a gritar desenfreadamente silenciando a suavidade com que o cantor havia cantado até então. É, sem margem para dúvidas, um começo estupendo.
2.       Grace – A música que partilha o seu título com o LP é, indubitavelmente, um dos pontos altos do mesmo. Liricamente, esta música traz-nos a concepção do cantor acerca de diversas temáticas como, por exemplo, a morte. Esta faixa abre com um riff absolutamente estupendo e aparece-nos, novamente, com um personagem que canta de uma maneira triste e escura. Com uma instrumentalidade única, Jeff prepara, ao longo da música, o momento da sua explosão. Levando-nos a divagar no verso «Wait in the fire», Buckley explode, uma vez mais, e solta a dor que há em si. Ao leme do poderio instrumental (com realce para a bateria), solta-se o vazio que existia no cantor e somos invadidos por um grito sobrenatural e que nos leva para outra galáxia. Magnífico.
3.       Last Goodbye – A fatia do génio de Buckley que mais sobressai nesta música é o seu modo de escrever. Com uma linha de baixo agradável, edifica-se uma música que descreve o fim de uma relação como ponto de partida para o entendimento do quão importante uma pessoa pode ser na vida de outra pessoa. Ao invés das primeiras duas músicas, esta faixa não nos aparece marcada por nenhum momento de explosão. A voz de Jeff mantém-se regular desde o início ao fim, sempre afinada e bela. Sentimental.
4.       Lilac Wine - Lilac Wine é a primeira faixa do álbum que não é escrita pelo cantor norte-americano. Esta composição lírica foi escrita por James Sheldon no longínquo ano de 1950, tendo várias interpretações como, por exemplo, a de Nina Simone e a de Elkie Brooks. Com uma instrumentalidade simples, dá-se, uma vez mais, alento à capacidade vocal de Jeff, e constrói-se, a meu ver, uma das melhores covers alguma vez feitas. Penetrante.
5.       So Real – Esta música é, se é que posso afirmar isto, a minha favorita de todo o álbum. E, além disso, foi através desta música que comecei a atentar, música a música, estrofe a estrofe, verso a verso, em Jeff Buckley. Com uma instrumentalidade, uma vez mais, demolidora, a composição lírica é envolta de ouro. No refrão, o verso «Oh that was so real», a bateria e o baixo ganham volume e corpo e a música ganha vida. Num certo momento, Buckley aparece-nos apenas a falar e não a cantar, fala de uma maneira assustadora e cria-se uma atmosfera suja e escura. Nesta faixa assinala-se um ponto de viragem em Grace, passando-se de uma música mais simples para uma música mais complexa e, ainda mais, sentimental. Perfeita.
6.       Hallelujah – A música mais reconhecida de toda a discografia de Jeff Buckley é Hallelujah. Originalmente escrita e interpretada pela lenda Leonard Cohen, esta é a faixa que exponencia o talento incrível de Buckley para a guitarra. Ao longo desta relíquia musical, dá-se uma fusão encantadora e apaixonante entre a guitarra e a voz do cantor. No decorrer de toda a música, Jeff presenteia-nos com momentos em que parece apaixonar-se pelo que canta e quando o faz é simplesmente incrível. Canta com a alma a transbordar amor e paixão, canta de uma maneira sublime e dá uma nova vida à música de Cohen. Esta é a maior música de todo o álbum, tendo 6 minutos e 53 segundos. Sendo uma das pérolas da discografia de Buckley, esta música alargou-se à escala global e transformou-se numa das melhores covers de sempre. A meu ver, esta interpretação de Buckley consegue mesmo ser superior (e em muito) à sua versão original. Um dos momentos de Grace. Apaixonante.
7.       Lover, You Should've Come Over – A faixa número 7 de Grace é, sem margem para dúvidas, a melhor música do álbum [Contudo, não se trata da minha favorita]. Com uma sonoridade exímia, esta música aparece-nos envolta de um lirismo perfeito. Esta é, mesmo, uma das músicas mais emocionantes e sentimentais que já ouvi. A canção assenta numa das temáticas que mais encabeçam o LP, assentando na «perda de alguém», no «amor vazio» … A ânsia desmedida do querer preencher o vazio que ficou no seu coração, notória na sua voz, aliada à tristeza musical que é sentida, criam uma atmosfera intensa e agarram o ouvinte durante os «longos» 6 minutos e 43 segundos. Ouro sobre azul, brilhante.
8.       Corpus Christi CarolCorpus Christi Carol é a outra música do registo em que a letra não conta com a autoria do cantor norte-americano [O autor deste belo poema é desconhecido e remota o século XVI]. É, a meu ver, o ponto baixo de todo o álbum. A voz de Buckley aparece, mais uma vez, deslumbrante, mas não se sente a presença do cantor como se sentia nas outras músicas até aqui analisadas. É uma música que parece um pouco desenquadrada com o panorama de todo o disco e parece-me um pouco desfasada daquele «ponto de viragem» que referi na faixa So Real. Sem muito  por onde explorar, trata-se de uma música com uma sonoridade bastante simples e fina que acaba por funcionar bem. Razoável.
9.       Eternal Life - «This is a song about...it’s an angry song. Life's too short and too complicated for people behind desks and people behind masks to be ruining other people's lives, initiating force against other people's lives on the basis of their income, their color, their class, their religious beliefs, their whatever...» disse Jeff Buckley em Live at Sin-é [disco ao vivo que aconselho vivamente]. De facto, nesta música conhecemos um novo Jeff Buckley, que canta efusivamente a raiva que sente. Fustigado pela necessidade de descobrir a real essência da vida e do amor, o cantor presenteia-nos com a sua versatilidade genial. Aparecendo-nos com uma sonoridade violenta, é uma música que contrasta evidentemente com todo o álbum, dando-lhe uma nova amplitude. Repleta de mensagem e de conselhos e apetrechada de um lirismo simples mas eficaz, a voz de Buckley soa-nos agressiva e encoraja-nos a esquecer tudo porque a vida é demasiado curta, não sendo eterna, e merece, por isso, ser [bem] vivida. Absolutamente genial.
10.   Dream Brother – Esta música revela-nos uma musicalidade misteriosa que remete-nos, em parte, para um estilo indiano. [De facto, Buckley era adepto de música indiana; aliás, chegou mesmo a interpretar a célebre Yeh Jo Halka Saroor Hai, de Nusrat Fateh Ali Khan, em Sin-é] Do ponto de vista lírico, podemos dizer que a música retrata-nos uma introspecção de Buckley acerca da sua infância e acerca do seu pai, Tim Buckley. Notam-se, por isso mesmo, evidências do quão profundo é o sentimento do cantor na escolha do vocabulário a empregar nesta canção. A guitarra e a bateria, uma vez mais predominantes nas músicas do cantor, fundem-se com a sua voz elegante e criam, novamente, uma atmosfera intensa que se vai intensificando ao longo de todo o arrojo musical. Um desenlace muitíssimo bom.

O álbum Grace, de Jeff Buckley, é, muito provavelmente, o LP mais intenso, emocionante, poético e belo que eu alguma vez ouvi. Num disco repleto de sentimento, Buckley consegue produzir um som onde demonstra ter capacidades vocais (quase) sobrenaturais e um talento imenso para a guitarra, isto tudo, aliado à mestria com que o norte-americano escrevia.

Jeff Buckley é um daqueles artistas que tinha tudo para singrar a solo. A aliança entre a sua voz, absolutamente poderosa, a sua enorme capacidade para escrever, a sua versatilidade e o seu dom para a guitarra geram-nos a ideia de que, se hoje fosse vivo, Jeff seria uma daqueles artistas consagrados à escala global.

Gracioso, haverá sempre um cristal cintilante que brilha no fundo de um rio.


Emanuel Graça

Mixtape da Semana // Week 8

Para a sua oitava edição a Mixtape da Semana traz-vos, novamente, uma escolha temática; dez canções vindas directamente do Reino Unido para os vossos ouvidos. Fundindo bandas clássicas (The Beatles, The Smiths) com nomes mais contemporâneos (Gorillaz, Radiohead), esta é uma playlist que não vão querer perder!

Esta Mixtape conta com as seguintes faixas:
·         Rhinestone Eyes Gorillaz
·         Do You Remember the First Time?Pulp
·         Elephant Stone The Stone Roses
·         IsolationJoy Division
·         Electioneering Radiohead
·         Paint It Black The Rolling Stones
·         Just Like Heaven The Cure
·         Still Ill The Smiths
·         The Seeker The Who
·         Baby, You’re a Rich Man The Beatles

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Mixtape da Semana // Week 7

Presença habitual das noites de Segunda-Feira, a Mixtape da Semana volta hoje para alegrar as vossas vidas, com 10 pérolas da música que o MDC escolhe de propósito para os vossos atentos ouvidos.

Nesta sétima edição, a Mixtape vem com um carácter mais temático e temporal, abrangendo apenas canções dos anos 90. Esta playlist começou a formar-se na minha cabeça quando, por algum acaso, me lembrei de Devils Haircut (do norte-americano Beck). A partir daí, juntei-lhe alguns nomes cliché (como Nirvana ou Oasis), e misturei-os bandas menos conhecidas que, a meu ver, representam bem essa década rica em boa música. Apesar da predominância do Alternative Rock, também estão aqui algumas escolhas mais outside the box, como o Hip-Hop de Ice Cube ou o House dos Air. Resumindo, é um bom tempinho que se passa a ouvir estas canções.

Esta Mixtape conta com as seguintes faixas:
·         Dia MauOrnatos Violeta
·         Devils Haircut Beck
·         Don’t Look Back in Anger Oasis
·         Car Built to Spill
·         Passat Dream Pavement
·         No Distance Left to RunBlur
·         Heart-Shaped BoxNirvana
·         When You Sleep My Bloody Valentine
·         Kelly Watch the Stars Air
·         It Was a Good Day Ice Cube


sábado, 11 de fevereiro de 2012

Amongst These Splintered Minds//Leaden Thoughts Sing Softly

Com lançamento marcado para 24 de Fevereiro (numa edição exclusiva em formato cassette, limitada a 25 exemplares), Amongst These Splintered Minds//Leaden Thoughts Sing Softly é o LP de estreia dos The Act of Estimating as Worthless, um grupo nova-iorquino de Indie Folk liderado pela dupla de Zoe Grant e Matthew Van Esselt. O álbum, disponível para download gratuito no Bandcamp do grupo desde o dia 3 de Janeiro (aqui), será hoje analisado no MDC.

Com uma abordagem do Indie Folk que já originou comparações com os The Moldy Peaches, devido ao contraste Boy/Girl da voz doce de Zoe com o registo grave de Matthew, os The Act of Estimating as Worthless são um projecto um tanto ou quanto obscuro, de quem pouco se sabe, exceptuando a existência de uma demo e um EP homónimo. Confesso que só descobri esta maravilhosa banda com a review do The Needle Drop (de onde já retirei magníficas sugestões), e em boa hora o fiz, pois a estreia dos The Act of Estimating as Worthless é simplesmente um mimo, de uma ponta à outra.

Preenchido por uma sonoridade riquíssima e cheia de texturas e influências diferentes, Amongst These Splintered Minds//Leaden Thoughts Sing Softly traz-nos um Indie Folk de pendor predominantemente acústico, que prima pelas paisagens belas e calmas. Extremamente bucólicos e contemplativos, os The Act of Estimating as Worthless juntam, neste LP, a faceta do Indie Folk mais “ocidental” com instrumentos de sopro e violinos “balcânicos” que lembram, por vezes, Beirut ou até Neutral Milk Hotel (estes últimos particularmente nos momentos em que entra em cena o baixo distorcido e “espesso”).

No departamento vocal, já aqui falado, está presente outra das pérolas deste Amongst These Splintered Minds//Leaden Thoughts Sing Softly. O trabalho aqui desempenhado por Zoe e Matt, cheio de contrastes e harmonias, faz transparecer uma simplicidade e uma inocência verdadeiramente enternecedoras. Nas letras, assiste-se a uma mistura de um discurso envolto numa aura poética com uma ingenuidade pueril, algo que resulta muito bem e complementa de forma fantástica a instrumentação. Na produção podemos assistir a um balanço entre o calor do acústico com a frieza do Lo-Fi, algo que é bastante difícil de atingir, mas que os The Act of Estimating as Worthless conseguiram fazer de forma quase perfeita neste LP.

Contudo, também existem algumas características no disco que não me agradaram, de todo; um dos primeiros “defeitos” que me chamou à atenção em Amongst These Splineterd Minds//Leaden Thoughts Sing Softly foi a homogeneidade do álbum, que por vezes chegou a ser excessiva, levando a que algumas canções me soassem apenas a repetições de outras, algo que definitivamente não trabalha a favor do LP.

Outra questão que me deixou de pé atrás foi a dinâmica entre canções, e a forma como foi gerida. Correndo o risco de parecer picuinhas, a verdade é que, por vezes, algumas canções mais ritmadas e mexidas criavam um ímpeto que depois se via imediatamente “afogado” em canções mais calmas e introspectivas. Isso, aliado à malfadada inconsistência que se fez sentir nos momentos mais mortos do álbum (e que expôs algum trabalho menos conseguido por parte do grupo), faz com que este registo dos The Act of Estimating as Worthless não consiga atingir um patamar superior de qualidade.

Na hora de apontar canções favoritas, tenho de escolher a intimista Bones, a galopante Massive Windows e aquela que a meu ver é a melhor faixa de Amongst These Splintered Minds//Leaden Thoughyts Sing Softly, a delicada e tocante Coup D’etre Humain, uma peça verdadeiramente incrível. Por sua vez, entre as faixas que a meu ver estão menos conseguidas contam-se Night Time, The Things We Remember e The Troll, que perdem quando em comparação com outras músicas do álbum.

Resumindo, este primeiro LP dos The Act of Estimating as Worthless é um verdadeiro doce, devido à beleza e singularidade da música que encontramos nele. A mais que evidente química presente nos vocais de Zoe e Matthew, os instrumentais bem conseguidos e as letras deliciosas do grupo, quando combinadas, fazem deste Amongst These Splintered Minds//Leaden Thoughts Sing Softly uma obra digna de atenção. É certo que tem alguns defeitos, mas a qualidade é mais que muita e compensa os “erros” cometidos. Uma coisa é certa, os The Act of Estimating as Worthless deixaram-me com água na boca, e eu espero que esta não seja a última vez que ouvimos falar deles.

Nota Final: 8,0/10

João Morais

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Mixtape da Semana // Week 6

Excepcionalmente saída a uma Quarta-Feira, a Mixtape da Semana de hoje traz-vos, mais uma vez, 10 músicas escolhidas a dedo pelo MDC.

Tendo como ponto de partida Bombay (do espanhol El Guincho), pensei em criar esta Mixtape com um tema marcadamente Alternative Pop. No entanto, e como podem ver pelas faixas escolhidas, rapidamente substituí essa premissa por uma abordagem puramente aleatória de “coisas que me soam bem”. Por isso, não esperem grande coerência desta Mixtape; contudo, devo dizer que estão aqui presentes 10 faixas bastante interessantes, que irão com certeza agradar a alguns de vós. Destaque para Slow (dos Twin Shadow) e Machine Gun (dos Portishead), duas canções que tenho em grande estima e que considero absolutamente obrigatórias.

Esta Mixtape conta com as seguintes faixas:
·         Bombay El Guincho
·         Walk in the Park Beach House
·         Summer Holiday Wild Nothing
·         Slow Twin Shadow
·         Bambi Tokyo Police Club
·         Y Control Yeah Yeah Yeahs
·         Machine Gun Portishead
·         Hell of a Life Kanye West
·         Cymbal Rush Thom Yorke
      ·         Chores Animal Collective