quarta-feira, 11 de julho de 2012

Reportagem: Optimus Primavera Sound 2012


Depois de uma magnífica estadia na bela cidade do Porto, e de alguns dias um mês para digerir as experiências e aclarar as ideias, aqui estou eu a apresentar-vos a reportagem MDC da primeira edição do Optimus Primavera Sound, versão nacional do mítico festival alternativo catalão, e que decorreu nos passados dias 7, 8, 9 e 10 de Junho, no Parque da Cidade.

Antes de me atirar à escrita sobre os concertos propriamente ditos, há que destacar dois aspectos essenciais, e que fizeram deste um festival único: o magnífico cenário, com a espectacular simbiose entre os três maiores palcos e a natureza que os rodeava (especial destaque para o All Tomorrow’s Parties), e o caloroso ambiente que se vivia ali, e que transformou o Parque da Cidade, por três dias, numa autêntica capital internacional da melomania.

Arrumado isto, falemos dos concertos propriamente ditos.

DIA 7

Palco Primavera Atlas Sound (19.00)
- Depois de uma gigantesca fila para levantar as pulseiras (faço aqui o mea culpa pela confusão que fiz) e de pedir informações ao Noiserv (que grande história que isto dá), o MDC chegou ao Parque da Cidade, ainda a tempo de apanhar parte da actuação de Bradford Cox. Porém, não se pode dizer que tenha sido um concerto muito inspirado; com um público bastante apagado e com Cox um bocado desligado de tudo e de todos, o show de Atlas Sound não deu sequer para aquecer, com muita pena minha.

Palco OptimusYann Tiersen (20.15)
- Deixando de lado o sr. Cox e as suas experimentações masturbatórias, decidi ir logo para o palco onde iria actuar Yann Tiersen. Num concerto repleto de canções viciantes e afiadas, e uma Pop dançável e extremamente enérgica, o francês só terá desiludido quem ainda tinha esperanças de ouvir pedaços das bandas-sonoras de Amélie ou Goodbye Lenin. Apesar da chuva, que fez questão de marcar a sua presença a meio da setlist, o espectáculo de Yann Tiersen foi, para mim, o ponto alto do primeiro dia.

Palco Primavera - The Drums (21.30)
- Já a lua fazia questão de aparecer quando subiu ao palco este grupo oriundo de Brooklyn. Apesar de muita gente já ter “cuspido” na actuação dos The Drums, eu não posso dizer que tenha saído dali desiludido. Com a sua Indie Pop alegre, catchy e a puxar os pés para a dança, o grupo liderado por Jonathan Pierce conseguiu assinar uma actuação sólida e imaculada, onde só ficou a faltar a Forever and Ever, Amen.

Palco OptimusSuede (22.45)
- Apesar de apreciar bastante os dois primeiros discos dos Suede (o homónimo de 1993 e Dog Man Star de 1994), não posso dizer que seja um grande fã da banda, nem que esperava ansiosamente este concerto. Porém, não há como nega-lo: hinos como Animal Nitrate, We Are the Pigs ou Beautiful Ones parecem ter sido talhados para as grandes audiências, e não há como escapar ao sing-along. Em suma, durante cerca de uma hora e meia o Parque da Cidade regressou aos anos 90.

Palco Primavera Mercury Rev (0.30)
- Não consigo colocar por palavras a desilusão que senti com a actuação dos Mercury Rev no Optimus Primavera Sound. Colado à grade, esperava a delicadeza e a doçura Dream Pop dos seus grandes êxitos, mas o que me saiu foi um Rock de bordel rasca e barato, regado com vinhaça reles. Tirando um ou outro momento em que conseguiram escapar deste ambiente desolador, não houve nada que me interessasse no concerto do grupo de Jonathan Donahue.

Palco OptimusThe Rapture (2.00)
- Confesso que fui para o concerto de The Rapture a medo e sem saber bem o que me esperava, isto porque “decidi” passar ao lado de In the Grace of Your Love, o disco de 2011 da banda norte-americana. Porém, só tenho a dizer que fiquei rendido aos nova-iorquinos depois do show que deram. Numa hora repleta de energia, groove e música extremamente catchy, o Dance Punk dos The Rapture conseguiu pôr toda a gente a dançar. E How Deep is Your Love, o “hino” do festival, foi cantado a plenos pulmões no Parque da Cidade.

DIA 8

Palco Primavera Linda Martini (17.00)
- Uma das bandas mais acarinhadas do panorama musical nacional, os Linda Martini são um daqueles nomes que brilha seja em que cartaz for, e o concerto no Optimus Primavera Sound foi mais uma prova disso. Trazendo no bolso um Alternative Rock carregado de energia, catarse e rebeldia, o quarteto lisboeta fez com que, durante 45 minutos, o Parque da Cidade se transformasse num cenário de combate. A guitarra partida, o crowdsurfing a rodos e o pó levantado dos moshpits foram a prova disso.

Palco OptimusWe Trust (18.00)
- These New Countries, o álbum de estreia de We Trust, o projecto do (também realizador) André Tentugal, foi considerado aqui pelo MDC como um dos melhores 20 discos de 2011 (ficou em 19º), e isso deveu-se à sua frescura e à beleza e delicadeza das suas composições. Porém, na transposição das músicas para o palco, confesso que não fiquei propriamente entusiasmado. Um concerto morno, com uma audiência mortiça, traduziu-se na minha migração para o Palco Club. Fica para a próxima.

Palco ClubOther Lives (18.15)
- Apanhei a actuação dos norte-americanos Other Lives já a meio, e apenas tive tempo para assistir a um par de canções, pelo que não há muito que eu possa dizer acerca deste concerto. Porém, uma coisa é certa: a Folk meio experimental e psicadélica do grupo liderado por Jesse Tabish não foi, de todo, talhada para um palco tão “urbano” quanto o Club.

Palco Primavera Yo La Tengo (19.00)
- Estaria a mentir se dissesse que sou um die-hard fan dos Yo La Tengo, mas a verdade é que este era um dos nomes do festival que eu mais ansiava por ver, tanto pela relevância histórica que a banda teve no Alternative Rock norte-americano dos anos 80 e 90 como pela qualidade das canções que lhes conheço. E não posso dizer que tenha ficado desiludido; num concerto recheado tanto de feedback e distorção abrasiva como de canções deliciosamente Pop e catchy, Ira Kaplan, Georgia Hubley e James McNew conquistaram-me por completo, assim como às pessoas que se deslocaram ao Palco Primavera para os ver. Ouvi dizer por lá que “não se tendo Sonic Youth, tem-se Yo La Tengo”, mas a verdade é que este trio joga num campeonato só deles.

Palco ClubChairlift (20.45)
- Para fugir a Rufus Wainwright fui-me abrigar para o Palco Club, desta vez para ver se apanhava um bocadinho da actuação dos Chairlift. O duo, composto por Caroline Polachek e Patrick Wimberly (a quem se juntam, em palco, mais três músicos), veio a Portugal mostrar Something, um disco cheio de deliciosa Indie Pop que tem feito as maravilhas da crítica (incluindo aqui o MDC). Apesar de não ter estado muito tempo a ver o concerto, posso dizer que não fiquei desiludido com a música viciante e dançável dos Chairlift. Fico à espera de mais oportunidades para os ver, de preferência por inteiro.

Palco Primavera The Flaming Lips (21.30)
- Para coroar um dia que já estava a ser bastante incrível vieram os The Flaming Lips, e o seu reputado espectáculo de psicadelismo e fantasia. Sendo eu um grande fã da música do grupo, posso dizer que este era, sem dúvida, um dos concertos que eu mais esperava de todo o festival, tanto pela (magnífica) componente musical como pelo show visual que a banda de Wayne Coyne faz questão de dar ao público. E mais uma vez, Coyne e companhia excederam-se e deram a quem se deslocou ao Palco Primavera a “noite das suas vidas”. Bolas de espelhos, confettis, mãos gigantes que disparam lasers, dançarinas “tirolesas” a saltarem nas laterais do palco, crowdsurfing dentro de uma bolha de plástico, todas estes ingredientes juntaram-se à proficiência musical dos The Flaming Lips e ao delírio do público para fazer com que este fosse, sem dúvida, um dos pontos altos de todo o festival. Apesar de ter ficado triste por ter perdido os Black Lips, que ao mesmo tempo faziam a revolução Rock no Palco Club, a verdade é que Worm Mountain, Yoshimi Battles the Pink Robots, Pt. 1, Race for the Prize ou Do You Realize?? conseguiram levar-me aos céus. Um concerto de outro mundo, e um dos melhores a que já tive o prazer de assistir.

Palco All Tomorrow’s PartiesShellac (23.30)
- No que toca à produção de discos lo-fi, as coisas passam-se do seguinte modo: Steve Albini no céu, Steve Albini na terra, e deus não é perdido nem achado no assunto. Por isso, e porque sou um gigantesco fã dos projectos musicais do norte-americano (especialmente dos Big Black, seminal banda Noise dos anos 80), não podia perder a chance de o ver em palco a malhar forte e feio numa guitarra eléctrica, acompanhado Bob Weston (baixo) e Todd Trainer (bateria). Prayer To God, Squirrel Song, Steady as She Goes ou My Black Ass foram algumas das munições disparadas de rajada por um Albini frio, distante mas sempre muito, muito poderoso. Destaque também para The End of Radio (polvilhada com Transmission, dos Joy Division), que conseguiu mostrar-me algo que nunca pensava ser possível; como deixar uma plateia inteira em suspense apenas com um simples riff de baixo, umas estocadas na tarola e um magnífico discorrer de spoken word. Simplesmente espectacular.

Palco ClubBeach House (1.00)
- Novamente, a dor de fazer escolhas difíceis, desta vez entre The Walkmen no Palco Primavera ou Beach House no Palco Club. Tendo já visto o grupo de Hamilton Leithauser ao vivo, no SBSR do ano passado, decidi optar pela novidade e fui ver o grupo de Victoria Legrand e Alex Scally, que lançou há pouco tempo o mui belo Bloom (cuja review está para sair, “trust me”). E, apesar da má escolha de palco e do ambiente meio manhoso que se sentia no público, não posso dizer que me tenha sentido defraudado com a minha decisão. Numa hora absolutamente mágica, a música etérea e hipnotizante dos Beach House e o jogo de luzes sedutor deixou-me totalmente inebriado. É verdade que com outras condições teria sido um concerto ainda melhor, mas mesmo assim o espectáculo foi bastante especial.

Palco OptimusM83 (2.15)
- Cansado, ensonado e esfaimado, fiz ainda assim o esforço e fui ver os franceses M83 ao palco principal, como forma de encerrar a noite em grande. Contudo, não posso dizer que tenha ficado totalmente encantado (se bem que a culpa também pode ter sido do meu estado de espírito). Num concerto que me pareceu um pouco morno e demasiado curto, salvaram-se alguns pontos altos que aqueceram o público na noite fresca. E obviamente que Midnight City, com presença de um saxofonista, fez as maravilhas de muitos festivaleiros.

DIA 9
Palco Primavera Gala Drop (17.00)
- Depois da bem-sucedida “luta” por um bilhete para os concertos na Casa da Música do dia seguinte, seguiu-se um pulinho bem pequenino pelo Palco Primavera para ver os portugueses Gala Drop. Apresentando o psicadélico Broda, o mais recente EP do grupo e que foi gravado em conjunto com o guitarrista norte-americano Ben Chasny (Six Organs of Admittance), o grupo teve de lutar contra a chuva, que teimava em flagelar quem se encontrava no Parque da Cidade. Porém, daquilo que ouvi (e que não foi muito), posso dizer que fiquei agradado. Fico à espera de uma próxima oportunidade de os apanhar ao vivo.

Palco ClubVeronica Falls (18.15)
- Para alguma coisa havia de servir o amaldiçoado Palco Club, e serviu à justa para abrigar da chuva aqueles que se recusavam a enfrentar a mansa enxurrada que flagelava o Parque da Cidade. E para servir de banda-sonora perfeita para o cenário cinzento que se desenhava no recinto vieram os Veronica Falls, com a sua Indie Pop penumbrenta e sombria. Num concerto que animou as hostes q.b. (especialmente quando se tem em conta que mais de metade das pessoas presentes apenas estavam à espera que a chuva passasse), Found Love in a Graveyard e Beachy Head foram definitivamente pontos altos.

Palco Primavera Spiritualized (19.00)
- Um dos nomes mais esperados do 3º dia do festival, os Spiritualized do britânico Jason Pierce conseguiram chamar ao Palco Primavera uma enchente de pessoas que, temerárias, decidiram enfrentar a chuva que se recusava a ir embora. Em troca, a multidão recebeu da parte dos Spiritualized um concerto curto mas extremamente sólido, e que para além da apresentação do mais recente Sweet Heart Sweet Light (cuja review também está para sair) trouxe também alguns temas mais “clássicos”, como a (apropriada) Lord Let It Rain on Me, Ladies and Gentlemen We Are Floating in Space, Come Together ou a cover dos saudosos Spacemen 3, Walkin’ With Jesus.

Palco OptimusKings of Convenience (23.00)
- Depois da desilusão do cancelamento de Death Cab for Cutie (que se deu, em parte, por culpa da organização) e de um pulinho pelo palco ao lado para ver os retornados The Afghan Whigs, lá fui eu de novo para o palco principal para ver outro nome “grande” do dia: os Kings of Convenience, que vieram substituir a islandesa Björk. E cá para nós, que ninguém nos ouve, acho que ficámos mais bem servidos com este duo sueco que trouxe, para além das cantigas de amigo e das melodias agridoces, muita boa disposição e animação ao Parque da Cidade. Homesick, Misread ou I’d Rather Dance with You foram, sem dúvida, pontos incontornáveis de um concerto maravilhoso.

Palco Primavera Saint Etienne (0.35)
- Tendo já perdido os Wavves e os Dirty Three nos palcos secundários, deixei-me ficar pela zona dos palcos principais para apanhar um bocado do concerto dos Saint Etienne. Apresentando o seu oitavo disco de estúdio, Words and Music by Saint Etienne, o trio britânico de Electronica trouxe um show rico em dança e euforia, onde só ficou a faltar a bola de espelhos. Destaque também para o glamour de um grupo de espanhóis a snifar coca mesmo ao meu lado. Priceless.

Palco OptimusThe xx (1.50)
- E foi com os The xx, um dos nomes mais esperados do festival, que se encerraram os concertos nos  palcos principais do Parque da Cidade. Num concerto intimista, etéreo e melancólico, o grupo trouxe na bagagem algumas das canções que irão integrar Coexist, o segundo disco do trio britânico e que tem data de lançamento marcada para 10 de Setembro. Porém, e isto é indiscutível, foram as canções de xx, o álbum de estreia de 2009, que fizeram com que a numerosa plateia se rendesse a Romy Croft, Oliver Sim e Jamie Smith. Para além disso, fica também registada a (na minha opinião) terrível interpretação de Crystalised, mas que não chegou para meter mácula num concerto onde Heart Skipped a Beat, Basic Space e VCR se fizeram ouvir pelos pulmões de milhares de pessoas.

DIA 10

Sala SuggiaThe Olivia Tremor Control (20.30)
- E foi em modo gourmet, no salão “nobre” da Casa da Música do Porto que teve lugar o último dia do Optimus Primavera Sound. Em palco, o grupo The Olivia Tremor Control (que é como quem diz “os The Beatles underground americanos dos anos 90”) trouxeram um show cheio de psicadelismo, energia e loucura. Misturando a acidez Rock com uma instrumentação deveras peculiar para uma banda Pop (violinos e flautas incluídas), o retornado grupo mostrou que, mesmo com a prolongada pausa, os anos mal passaram por eles. Destaque especialmente para I Have Been Floated, do (maravilhoso) Black Foliage: Animation Music Volume One, de 1999, e que contou com a participação especial de Jeff Mangum, que pouco tempo depois pisaria ele próprio, pela segunda vez, aquele palco.

Sala Suggia Jeff Mangum (22.00)
- Não escondo que, de todo o cartaz, este era o concerto que mais aguardava. Devoto incondicional dos Neutral Milk Hotel e fanboy assumido de In the Aeroplane Over the Sea (1998), admito que me senti como uma miúda de 12 anos quando vi o “regresso dos mortos” de Jeff Mangum e a sua posterior confirmação para este festival. E quando chegou o momento do cantautor em palco, notava-se que não era o único a sentir-se assim. Com um público totalmente rendido e em completa comunhão com o artista (que convidou a plateia a aproximar-se dele e a sentar-se no chão), Mangum trouxe uma setlist inspirada primariamente em ITAOTS; Two-Headed Boy (partes 1 e 2 back-to-back), Holland, 1945, ou Ghost fizeram com que toda a Sala Suggia cantasse a plenos pulmões, mais do que tinham cantado nos três dias anteriores. No entanto, houve mais canções para além das do icónico segundo álbum dos Neutral Milk Hotel. Servindo como “brindes” para uma audiência que esperou mais do que uma vida por este concerto, Song Against Sex, Little Birds ou Gardenhead/Leave Me Alone caíram que nem ginjas aos ouvidos dos fãs mais ferrenhos do artista (entre os quais eu, modestamente, me incluo). Para terminar uma actuação brilhante veio a delicada e tocante Oh Comely, numa interpretação capaz de levar muitos às lágrimas. Para mim (e apesar de terem havido outros concertos no Hard Club), o Optimus Primavera Sound não podia ter acabado de melhor forma. Porra, podia ter ali acabado o mundo que eu sairia de lá com um sorriso nos lábios.
Setlist

João Morais

PS:Todas as (difusas e escassas) fotos foram tiradas em colaboração com a Diana Carvalho <3

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